1.4 Elementos aleatórios

Muitas vezes não estamos interessados no resultado exato do nosso experimento aleatório, mas sim em uma determinada medição ou função de ωΩ\omega\in\Omega. Por exemplo, no caso do Exemplo 1.1 c)c), talvez não nos interesse toda a função ff, mas apenas o seu valor no fim do dia f(1)f(1). Essas medições são ditas elementos aleatórios que definimos à seguir.

Seja (E,𝒜)(E,\mathcal{A}) um espaço mensurável. Nesse caso, se X:ΩEX:\Omega\to E é uma função (,𝒜)(\mathcal{F},\mathcal{A})-mensurável, dizemos que XX é um elemento aleatório em (Ω,)(\Omega,\mathcal{F}) tomando valores em EE, ou um EE-elemento aleatório.

{example}

Consideramos os casos

  1.  a)

    X:ΩX:\Omega\to\mathbb{R} mensurável é dita variável aleatória.

  2.  b)

    X:ΩdX:\Omega\to\mathbb{R}^{d} mensurável é dito vetor aleatório (dd-dimensional).

  3.  c)

    X:ΩC[0,1]X:\Omega\to C[0,1] mensurável é dita função aleatória.

Seguindo a motivação do Exemplo 1.1 c)c), poderia ser que, por exemplo, estivéssemos interessados apenas na variável aleatória X:Ω3X:\Omega_{3}\to\mathbb{R} dada por X(f)=f(1)X(f)=f(1).

{exercise}

Mostre que X:Ω3X:\Omega_{3}\to\mathbb{R} dada por X(f)=f(1)X(f)=f(1) é uma variável aleatória.

Citando Kingman em seu livro Poisson Processes: “a random elephant is a function from Ω\Omega into a suitable space of elephants.

Relembrando a nossa notação: P[XA]=P({ωΩ;X(ω)A})P[X\in A]=P(\{\omega\in\Omega;X(\omega)\in A\}).

{proposition}

Seja X:ΩEX:\Omega\to E onde (E,𝒜)(E,\mathcal{A}) é um espaço mensurável com 𝒜=σ(𝒢)\mathcal{A}=\sigma(\mathcal{G}). Então para verificar que XX é um elemento aleatório, basta provar que X1(G)X^{-1}(G)\in\mathcal{F} para todo G𝒢G\in\mathcal{G}.

Demonstração.

Teoria da Medida. ∎

{example}

Se Ω\Omega e EE são espaços topológicos dotados das correspondentes σ\sigma-álgebras de Borel, então toda função contínua é um EE-elemento aleatório.

1.4.1 Distribuição de elementos aleatórios

{definition}

Se X:ΩEX:\Omega\to E é um elemento aleatório e Ω\Omega é dotado de uma probabilidade PP, então denotamos por XPX_{*}P, a chamada distribuição de XX , a medida de probabilidade

XP(A):=P({ωΩ;X(ω)A})=P[XA].X_{*}P(A):=P\big{(}\{\omega\in\Omega;X(\omega)\in A\}\big{)}=P[X\in A]. (1.25)

no espaço mensurável (E,𝒜)(E,\mathcal{A}).

{remark}

Essa definição corresponde com a de medida imagem vista no curso de integração que tem um papel ainda mais importante em probabilidade.

Fica como exercício verificar que XPX_{*}P é de fato uma probabilidade em EE.

{exercise}

Seja X:[0,1]{0,1}X:[0,1]\to\{0,1\} dada por X(ω)=\1A(ω)X(\omega)=\1_{A}(\omega). Nesse caso, mostre que XP=\Ber(p)X_{*}P=\Ber(p) para algum p[0,1]p\in[0,1]. Calcule o valor de pp.

Duas notações importantes nesse contexto são:

  1.  a)

    Sejam (Ω,,P)(\Omega,\mathcal{F},P) e (Ω,,P)(\Omega^{\prime},\mathcal{F}^{\prime},P^{\prime}) dois espaços de probabilidade e XX e YY dois elementos aleatórios. Dizemos que X=dYX\stackrel{{\scriptstyle d}}{{=}}Y, quando XP=YPX_{*}P=Y_{*}P^{\prime}. Note que XX e YY nem ao menos precisam pertencer ao mesmo espaço de probabilidade para dizermos que são igualmente distribuídos, mas precisam ser elementos aleatórios de mesmo tipo (ou seja, possuir o mesmo contradomínio).

  2.  b)

    Escrevemos X\distrμX\distr\mu, que lê-se XX é distribuída como μ\mu, onde μ\mu é uma probabilidade em EE, caso XP=μX_{*}P=\mu.

{exercise}

Sejam XX e YY variáveis aleatórias tais que XX é nula quase certamente. Mostre que X+YX+Y tem a mesma distribuição de YY.

O exercício acima é bastante simples, mas o usaremos para fazer uma importante observação sobre como são enunciados tipicamente os resultados de probabilidade.

Raramente encontramos teoremas que explicitam qual é o espaço de probabilidades Ω\Omega em questão. Como no exercício acima, o contexto de um teorema frequentemente é dado apenas em termos de elementos aleatórios em Ω\Omega e de suas distribuições. Dessa forma, podemos utilizar o resultado em vários contextos diferentes, desde que possamos encontrar elementos aleatórios que satisfaçam as hipóteses. Com o tempo, passamos até mesmo a considerar menos relevante a escolha específica do espaço amostral, focando cada vez mais na distribuição de seus elementos aleatórios.