4.5. Apêndice à Seção 4.4: funções convexas
4.5.1 Definição.
Seja um intervalo. Uma função é dita convexa quando para todos e todo vale a desigualdade:
Dizemos que é estritamente convexa quando para todos com e todo vale a desigualdade estrita:
Claramente a igualdade vale em (4.5.1) quando ou ; além do mais, as desigualdades (4.5.1) e (4.5.2) não se alteram quando trocamos por e por . Vemos então que é convexa (resp., estritamente convexa) se e somente se a desigualdade (4.5.1) (resp., a desigualdade estrita (4.5.2)) vale para todos com e para todo . Evidentemente toda função estritamente convexa é convexa.
Geometricamente, a desigualdade (4.5.1) diz que o trecho do gráfico de entre os pontos e está abaixo da correspondente reta secante. Vamos explorar algumas conseqüências da definição de convexidade. Dados com , vamos denotar por o coeficiente angular da reta que passa pelos pontos e ; mais explicitamente:
Se e , temos uma bijeção estritamente crescente:
cuja inversa é dada por:
Se , e , estão relacionados por (4.5.3) então:
Note também que:
para todo . Vemos então que:
(4.5.5) | ||||
e:
(4.5.6) | ||||
onde , , e , estão relacionados por (4.5.3). Observamos também que se , então existe tal que:
de fato, basta tomar . Segue de (4.5.7) que pertence ao intervalo fechado de extremidades e ; levando em conta (4.5.5) e (4.5.6) vemos então também que:
(4.5.8) | ||||
e:
(4.5.9) | ||||
Temos então o seguinte:
4.5.2 Lema.
Seja uma função definida num intervalo . As seguintes condições são equivalentes:
-
•
é convexa;
-
•
, para todos com ;
-
•
, para todos com ;
-
•
, para todos com .
Similarmente, são equivalentes as condições:
-
•
é estritamente convexa;
-
•
, para todos com ;
-
•
, para todos com ;
-
•
, para todos com .
Uma função convexa só deixa de ser estritamente convexa se for afim em algum trecho de seu domínio. Esse é o conteúdo do seguinte:
4.5.3 Corolário.
Seja uma função convexa num intervalo . Dados com então são equivalentes:
existe tal que ;
é afim no intervalo , i.e., existem com , para todo ;
, para todo .
Demonstração.
4.5.4 Corolário.
Seja uma função convexa num intervalo . Então não é estritamente convexa se e somente se existem e com e , para todo .∎
Dada uma função definida num intervalo e um ponto que não é a extremidade direita de , denotamos por a derivada à direita de no ponto , definida por:
desde que esse limite exista em . Similarmente, se não é a extremidade esquerda de , denotamos por a derivada à esquerda de no ponto , definida por:
desde que esse limite exista em .
4.5.5 Lema.
Seja uma função convexa num intervalo . Se não é a extremidade direita então a derivada à direita existe em e vale a desigualdade:
para todo com . Similarmente, se não é a extremidade esquerda então a derivada à esquerda existe em e vale a desigualdade:
para todo com . Quando é um ponto interior então existem e são finitas ambas as derivadas laterais , e vale a desigualdade:
Se é estritamente convexa então as desigualdades em (4.5.11) e (4.5.12) são estritas.
Demonstração.
Suponha que não é a extremidade direita. O Lema 4.5.2 nos diz que a função:
é crescente; segue então que o limite existe em e:
o que prova (4.5.11). Similarmente, se não é a extremidade esquerda então o Lema 4.5.2 nos diz que a função:
é crescente, donde o limite existe em e:
provando (4.5.12). Se é um ponto interior então o Lema 4.5.2 nos diz que:
sempre que , ; daí:
provando (4.5.13). Finalmente, se é estritamente convexa então o Lema 4.5.2 nos diz que as funções (4.5.14) e (4.5.15) são estritamente crescentes, o que prova as desigualdades estritas em (4.5.11) e (4.5.12). ∎
4.5.6 Corolário.
Seja uma função convexa num intervalo . Dados com então:
A desigualdade é estrita se é estritamente convexa.
Demonstração.
4.5.7 Corolário.
Se é uma função convexa num intervalo então é contínua em todos os pontos interiores de .
Demonstração.
Seja um ponto no interior de . A existência e a finitude das derivadas laterais e implica que os limites laterais e existem e são iguais a ; de fato:
Logo é contínua no ponto . ∎
4.5.8 Lema.
Seja uma função convexa num intervalo . Se é um ponto interior e é tal que então:
para todo . A desigualdade em (4.5.16) é estrita se é estritamente convexa e .
Demonstração.
Dada uma função e um ponto , então uma reta:
tal que e para todo é dita uma reta suporte para no ponto . O Lema 4.5.8 nos diz então que uma função convexa num intervalo possui uma reta suporte em todo ponto do interior do intervalo .
4.5.9 Lema.
Seja uma família não vazia de funções convexas num intervalo . Se para todo o supremo é finito então a função é convexa em .
Demonstração.
Sejam e . Para todo , temos:
tomando o supremo em , obtemos . ∎
4.5.10 Corolário.
Seja uma função definida num intervalo . Se admite uma reta suporte em todo ponto de então é convexa.
Demonstração.
4.5.11 Proposição.
Seja uma função derivável num intervalo . As seguintes condições são equivalentes:
-
(a)
é convexa;
-
(b)
a derivada é crescente;
-
(c)
, para todos (o gráfico de fica acima de suas retas tangentes).
Demonstração.
4.5.12 Corolário.
Seja uma função duas vezes derivável num intervalo . Então é convexa se e somente se a sua derivada segunda é não negativa.
Demonstração.
Evidentemente é crescente se e somente se é não negativa. ∎
Temos a seguinte versão da Proposição 4.5.11 para convexidade estrita.
4.5.13 Proposição.
Seja uma função derivável num intervalo . As seguintes condições são equivalentes:
-
(a)
é estritamente convexa;
-
(b)
a derivada é estritamente crescente;
-
(c)
, para todos com .
Demonstração.
4.5.14 Corolário.
Seja uma função duas vezes derivável num intervalo . Se sua derivada segunda é positiva então é estritamente convexa.
Demonstração.
Evidentemente é estritamente crescente se é positiva. ∎
4.5.15 Exemplo.
A recíproca do Corolário 4.5.14 não é verdadeira. De fato, a função é estritamente convexa, pois sua derivada é estritamente crescente. No entanto, temos .
4.5.16 Proposição.
Seja uma função convexa num intervalo . Dados e números reais não negativos , …, com então e:
se é estritamente convexa e então a igualdade vale em (4.5.17) se e somente se .
Demonstração.
Se e então e:
donde . Para provar o restante da tese, usamos indução em . O resultado é óbvio no caso que . Assumindo o resultado válido para um certo , sejam e com . Vamos mostrar que:
Se , vale a igualdade em (4.5.18). Suponha que . Seja , . Claramente e , donde a hipótese de indução nos dá:
Temos:
onde na primeira desigualdade usamos e a convexidade de . Isso prova (4.5.18). Suponha agora que , é estritamente convexa e vale a igualdade em (4.5.18). Daí todas as desigualdades em (4.5.19) são igualdades e portanto:
e:
Como , a hipótese de indução nos dá . Finalmente, (4.5.20) implica que . ∎