. Espaços Normados e com Produto Interno
Seja um espaço vetorial sobre , onde denota o corpo dos números reais ou o corpo dos números complexos.
.
Uma semi-norma em é uma aplicação:
satisfazendo as seguintes condições:
-
(a)
, para todo ;
-
(b)
, para todo e todo ;
-
(c)
, para todos (desigualdade triangular).
Uma norma em é uma semi-norma que satisfaz a condição adicional:
-
(d)
, para todo com .
Um espaço vetorial normado sobre
(ou, mais abreviadamente, um espaço normado) é um par
, onde é um espaço vetorial sobre e é uma norma em .
Note que fazendo na condição (b) obtemos:
Dado um espaço vetorial normado , nós definimos:
(4.1.1)
para todos . Temos que é uma métrica em ; de fato, segue das condições (a)
e (d) que, para todos , e que se e somente . Usando a condição (b), obtemos:
e usando a condição (c) obtemos:
para todos . Dizemos que a métrica definida em (4.1.1) é a métrica
associada à (ou determinada pela) norma .
Nós sempre assumiremos que um espaço normado está munido da métrica associada a sua norma.
Temos então que todo espaço normado é também um espaço métrico (para uma recíproca, veja
o Exercício 4.3).
.
Um espaço de Banach sobre é um espaço normado
sobre tal que a métrica associada à norma é completa.
.
Dado um conjunto arbitrário , então o conjunto de todas as funções possui uma estrutura
natural de espaço vetorial sobre definida por:
para todos , , . O conjunto de todas as funções
limitadas é um subespaço de e a aplicação definida
por:
para toda é uma norma em . A norma é chamada a norma do supremo
e a métrica associada a é chamada a métrica do supremo.
Temos que uma seqüência em converge para uma função
(resp., é de Cauchy) com respeito à métrica se e somente se converge uniformemente
para (resp., é uniformemente de Cauchy). Se é uma seqüência uniformemente de Cauchy
então também é pontualmente de Cauchy e portanto existe tal que
converge para pontualmente; segue do resultado do Exercício 2.36
que converge para uniformemente. Se todas as funções são limitadas, é fácil ver que
também é limitada, e portanto a métrica é completa e é um espaço de Banach.
Se é um espaço métrico (ou, mais geralmente, um espaço topológico) então o conjunto
de todas as funções contínuas e limitadas é um subespaço
de ; como o limite uniforme de funções contínuas é contínua, segue que é fechado
em e portanto também completo com a métrica (induzida por) . Segue que
também é um espaço de Banach munido da norma (induzida por) . Note que se é compacto
então toda função contínua é limitada, de modo que coincide com o espaço
de todas as funções contínuas .
.
Seja um espaço vetorial sobre . Um produto interno em é uma
aplicação:
satisfazendo as seguintes condições:
-
(a)
e , para todos
e todo , onde denota o complexo conjugado de ;
-
(b)
, para todos ;
-
(c)
, para todo com .
Note que a condição (b) implica que é real, para todo , de modo que faz sentido
falar em , na condição (c). Quando então para todo ,
de modo que as condições (a) e (b) podem ser substituídas respectivamente por:
-
(a’)
e , para todos
e todo ;
-
(b’)
, para todos .
Fazendo na condição (a) obtemos:
para todos ; daí:
e portanto:
para todos . Fazendo , na condição (a) obtemos então:
para todos e todo .
O primeiro resultado não trivial sobre produtos internos que provaremos é o seguinte:
(desigualdade de Cauchy–Schwarz).
Seja um espaço vetorial sobre e um produto interno em . Então:
(4.1.2)
para todos ; a igualdade em (4.1.2) vale se e somente se e são linearmente dependentes.
Demonstração.
Se e são linearmente dependentes então ou ou , para algum ;
daí é fácil ver que vale a igualdade em (4.1.2). Suponhamos então que e são linearmente independentes
e provemos que vale a desigualdade estrita em (4.1.2).
Provemos primeiramente que:
(4.1.3)
onde denota a parte
real
de um número complexo .
Considere a função definida por:
para todo . Temos:
para todo . Como e são linearmente independentes, temos que é não nulo, para todo
e portanto , para todo . Mas é uma função polinomial do segundo grau e portanto
seu discriminante:
deve ser negativo. Daí (4.1.3) segue diretamente. Seja agora com
tal que é real; trocando por
em (4.1.3) obtemos:
donde segue a desigualdade:
.
Seja um espaço vetorial sobre e um produto interno em . Então a aplicação
definida por:
(4.1.4)
para todo , é uma norma em .
Demonstração.
Note que, como para todo , a aplicação está bem definida
e , para todo ; além do mais, , para não nulo. Dados ,
, temos:
Finalmente, a desigualdade triangular é obtida da desigualdade de Cauchy–Schwarz, através dos cálculos abaixo:
onde .
∎
A norma definida em (4.1.4) é chamada a norma associada ao (ou determinada pelo)
produto interno .
.
Seja um espaço vetorial sobre e um produto interno em . O par
é chamado um espaço pré-Hilbertiano sobre .
Se a métrica associada à norma associada ao produto interno for completa, dizemos
que é um espaço de Hilbert sobre .
Nós sempre assumiremos que um espaço pré-Hilbertiano está munido da norma
(4.1.4) associada ao seu produto interno. Vemos então que todo espaço pré-Hilbertiano é um espaço normado
e todo espaço de Hilbert é um espaço de Banach. Nem toda norma está associada a um produto interno, como segue facilmente
do seguinte:
(identidade do paralelogramo).
Se é um espaço vetorial sobre , é um produto interno em e
é a norma associada a então:
(4.1.5)
para todos .
Demonstração.
Temos:
donde:
(4.1.6)
similarmente:
(4.1.7)
A conclusão é obtida somando (4.1.6) e (4.1.7).
∎
No Exercício 4.10 pedimos ao leitor para mostrar que a norma do supremo não satisfaz a identidade do paralelogramo
(exceto pelo caso trivial, em que o domínio tem um único ponto). Vemos então que nem toda norma está associada a um produto
interno. No Exercício 4.14 apresentamos um leitor um roteiro para demonstrar que toda norma
que satisfaz a identidade do paralelogramo está associada a um único produto interno.
Se é um subconjunto fechado não vazio de e é um subconjunto compacto não vazio de então
existem pontos , tais que , ou seja, a distância mínima entre e é explicitamente
realizada.
Como é ilustrado no exemplo a seguir, se é um espaço métrico arbitrário, é fechado em
e é um subconjunto compacto de ,
não é verdade em geral que a distância mínima entre e é realizada, mesmo sob a hipótese que o espaço métrico
seja completo (é verdade, no entanto, que se e são disjuntos então ).
.
Seja o espaço de Banach das funções contínuas munido da norma do supremo
(veja Exemplo 4.1.3) e seja o subespaço de constituído pelas funções
contínuas tais que . Claramente é um subespaço fechado de e
portanto é também um espaço de Banach. Seja o subconjunto de definido por:
Se uma seqüência em converge uniformemente para então (veja Exercício 2.26):
donde segue que é fechado em . Vamos mostrar que a distância
da função nula até é igual a ,
mas que não existe nenhuma função com . Em primeiro lugar, mostremos que não existe
com . De fato, suponha por absurdo que e . Daí
e , donde quase sempre; mas e a continuidade de implicam
que é menor que numa vizinhança de , o que nos dá uma contradição. Vamos agora mostrar que para todo
existe com . Obviamente podemos supor sem perda de generalidade
que ; seja e considere
a função definida por:
É fácil ver que e que . Logo ,
mas não existe com .
.
Seja um espaço pré-Hilbertiano sobre e seja um subconjunto
completo, não vazio, tal que , para todos . Então para todo existe um único
ponto tal que .
Demonstração.
Sejam , . Aplicando a identidade do paralelogramo (4.1.5) aos vetores
, , obtemos:
e portanto:
(4.1.8)
Seja . Provemos primeiramente a unicidade de . Se são tais que
então , de modo que (4.1.8) nos dá:
e daí . Para provar a existência de , seja uma seqüência em tal que
, para todo . Usando (4.1.8) com ,
e observando que , obtemos:
donde segue que é uma seqüência de Cauchy. Já que é completo, existe
com e daí fazendo em obtemos . Como
obviamente , a conclusão segue.
∎
.
Seja um espaço pré-Hilbertiano sobre . Dois vetores são ditos
ortogonais se . Seja um subconjunto
de . O complemento ortogonal de ,
denotado por , é conjunto dos vetores que são
ortogonais a todos os vetores de , isto é:
É fácil ver que o complemento ortogonal de um subconjunto de coincide com o complemento ortogonal
do subespaço vetorial de gerado por , de modo que a noção de complemento ortogonal é particularmente interessante
apenas para subespaços vetoriais. É fácil ver também que o complemento ortogonal de um subconjunto arbitrário de
é sempre um subespaço de .
.
Sejam um espaço pré-Hilbertiano sobre e um subespaço vetorial de .
Dados , , então se e somente se .
Demonstração.
Sejam , e suponha que . Dado então e portanto
os vetores e são ortogonais; pelo Teorema de Pitágoras (veja Exercício 4.15):
donde , para todo . Isso mostra que . Reciprocamente, suponha que
. Dado , considere a função definida por:
para todo . Temos:
para todo . Como , a função possui um mínimo global em e portanto:
Concluímos que:
(4.1.9)
para todo . Se , a demonstração já está completa. Se , podemos trocar por em (4.1.9),
o que nos dá:
onde denota a parte imaginária de um número complexo
.
Daí:
e a demonstração está completa.
∎
.
Sejam um espaço pré-Hilbertiano sobre e um subespaço vetorial de .
Dado então um ponto com é dito uma projeção ortogonal
de em .
Temos que a projeção ortogonal de em é única quando existe; de fato, se e
então e , de modo que
e .
.
Sejam um espaço pré-Hilbertiano sobre e um subespaço vetorial de .
Suponha que é completo (esse é o caso, por exemplo, se é um espaço de Hilbert
e é fechado em ). Então todo admite uma (única) projeção ortogonal .
Demonstração.
Segue da Proposição 4.1.10 que existe com .
O Lema 4.1.12 nos diz então que .
∎
.
Sejam um espaço pré-Hilbertiano sobre e um subespaço vetorial de .
Suponha que é completo (esse é o caso, por exemplo, se é um espaço de Hilbert
e é fechado em ). Então .
Demonstração.
Se então , de modo que . O Corolário 4.1.14
implica que todo elemento de é soma de um elemento de com um elemento de , i.e., .
A conclusão segue.
∎