5.2. Classes Monotônicas e Classes σ{\sigma}-aditivas

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos e 𝒜\mathcal{A} o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Digamos que nós saibamos que todo elemento de 𝒞\mathcal{C} satisfaz uma certa propriedade \mathbb{P} e que nós gostaríamos de verificar que todo elemento de 𝒜\mathcal{A} também satisfaz \mathbb{P}. Em geral pode ser inviável apresentar uma descrição concreta dos elementos de 𝒜\mathcal{A} a partir dos elementos de 𝒞\mathcal{C} (compare a complexidade do σ\sigma-anel dos Boreleanos da reta com a simplicidade da classe dos intervalos da reta, que é um conjunto de geradores para os Boreleanos). Uma possibilidade seria mostrar que a classe de todos os conjuntos que satisfazem a propriedade \mathbb{P} é um σ\sigma-anel; isso implicaria imediatamente que tal classe deve conter 𝒜\mathcal{A}. No entanto, existem situações concretas em que é difícil verificar que a classe dos conjuntos que satisfazem a propriedade \mathbb{P} é fechada por uniões enumeráveis e diferenças, mas é simples verificar que tal classe é fechada por operações como uniões (finitas ou enumeráveis) disjuntas ou diferenças próprias. O objetivo desta seção é o de provar resultados do seguinte tipo: se a classe de conjuntos 𝒞\mathcal{C} satisfaz certas hipóteses e se a classe de conjuntos que satisfaz a propriedade \mathbb{P} é fechada por certas operações então todo elemento do σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A} gerado por 𝒞\mathcal{C} satisfaz a propriedade \mathbb{P}.

Começamos com a seguinte:

5.2.1 Definição.

Seja \mathcal{E} uma classe de conjuntos. Dizemos que \mathcal{E} é uma classe monotônica se ∅︀\emptyset\in\mathcal{E} e se \mathcal{E} satisfaz as seguintes condições:

  • se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em \mathcal{E} e AkAA_{k}\nearrow A então AA\in\mathcal{E};

  • se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em \mathcal{E} e AkAA_{k}\searrow A então AA\in\mathcal{E}.

Dizemos que \mathcal{E} é uma classe σ\sigma-aditiva se \mathcal{E} é não vazia e satisfaz as seguintes condições:

  • se A,BA,B\in\mathcal{E} e AB=∅︀A\cap B=\emptyset então ABA\cup B\in\mathcal{E};

  • se A,BA,B\in\mathcal{E} e BAB\subset A então ABA\setminus B\in\mathcal{E};

  • se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em \mathcal{E} e AkAA_{k}\nearrow A então AA\in\mathcal{E}.

Claramente, se \mathcal{E} é uma classe σ\sigma-aditiva então ∅︀\emptyset\in\mathcal{E}; de fato, tome qualquer AA\in\mathcal{E} e observe que ∅︀=AA\emptyset=A\setminus A\in\mathcal{E}.

5.2.2 Exemplo.

Sejam μ:𝒜[0,+[\mu:\mathcal{A}\to\left[0,+\infty\right[, ν:𝒜[0,+[\nu:\mathcal{A}\to\left[0,+\infty\right[ medidas finitas num σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A}. Usando o Lema 5.1.6, vê-se facilmente que a classe de conjuntos:

{A𝒜:μ(A)=ν(A)}\big{\{}A\in\mathcal{A}:\mu(A)=\nu(A)\big{\}} (5.2.1)

é ao mesmo tempo uma classe σ\sigma-aditiva e uma classe monotônica.

Em analogia à Definição 5.1.19, enunciamos a seguinte:

5.2.3 Definição.

Se 𝒞\mathcal{C} é uma classe de conjuntos arbitrária então a classe monotônica gerada por 𝒞\mathcal{C} (resp., a classe σ\sigma-aditiva gerada por 𝒞\mathcal{C}) é a menor classe monotônica (resp., classe σ\sigma-aditiva) \mathcal{E} que contém 𝒞\mathcal{C}, i.e., \mathcal{E} é uma classe monotônica (resp., classe σ\sigma-aditiva) tal que:

  1. (1)

    𝒞\mathcal{C}\subset\mathcal{E};

  2. (2)

    se \mathcal{E}^{\prime} é uma classe monotônica (resp., classe σ\sigma-aditiva) tal que 𝒞\mathcal{C}\subset\mathcal{E}^{\prime} então \mathcal{E}\subset\mathcal{E}^{\prime}.

Dizemos também que 𝒞\mathcal{C} é um conjunto de geradores para a classe monotônica (resp., classe σ\sigma-aditiva) \mathcal{E}.

No Exercício 5.17 pedimos ao leitor para justificar o fato de que a classe monotônica (resp., a classe σ\sigma-aditiva) gerada por uma classe de conjuntos 𝒞\mathcal{C} está de fato bem definida, ou seja, existe uma única classe monotônica (resp., classe σ\sigma-aditiva) \mathcal{E} satisfazendo as propriedades (1) e (2) acima.

Temos o seguinte:

5.2.4 Lema (lema da classe monotônica).

Se \mathcal{R} é um anel então a classe monotônica gerada por \mathcal{R} coincide com o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}. Em particular, toda classe monotônica que contém um anel \mathcal{R} contém também o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}.

Demonstração.

Seja 𝒜\mathcal{A} o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R} e seja \mathcal{E} a classe monotônica gerada por \mathcal{R}. Segue do Lema 5.1.9 que todo σ\sigma-anel é uma classe monotônica e portanto 𝒜\mathcal{A} contém \mathcal{E}. Para mostrar que \mathcal{E} contém 𝒜\mathcal{A}, basta verificar que \mathcal{E} é um σ\sigma-anel. Dividimos o restante da demonstração em vários passos.

  • Passo 1.

    Se A,BA,B\in\mathcal{E} então ABA\cup B\in\mathcal{E}.

    Seja BB\in\mathcal{E} fixado e considere a classe de conjuntos:

    {A𝒜:AB}.\big{\{}A\in\mathcal{A}:A\cup B\in\mathcal{E}\big{\}}. (5.2.2)

    Afirmamos que (5.2.2) é uma classe monotônica. De fato, o conjunto vazio está em (5.2.2) pois BB\in\mathcal{E}. Se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em (5.2.2) e AkAA_{k}\nearrow A então A𝒜A\in\mathcal{A} e AkBA_{k}\cup B\in\mathcal{E}, para todo k1k\geq 1. Como (AkB)(AB)(A_{k}\cup B)\nearrow(A\cup B) e \mathcal{E} é uma classe monotônica, segue que ABA\cup B\in\mathcal{E}; portanto AA está em (5.2.2). Se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em (5.2.2) com AkAA_{k}\searrow A então verifica-se de modo análogo que AA está em (5.2.2), usando o fato que (AkB)(AB)(A_{k}\cup B)\searrow(A\cup B). Logo (5.2.2) é uma classe monotônica. Se o conjunto BB estiver no anel \mathcal{R} então ABA\cup B\in\mathcal{R}\subset\mathcal{E} para todo AA\in\mathcal{R} e portanto (5.2.2) contém \mathcal{R}; concluímos então que (5.2.2) contém \mathcal{E}, o que prova que ABA\cup B\in\mathcal{E}, para todo AA\in\mathcal{E} e todo BB\in\mathcal{R}. Seja agora BB\in\mathcal{E} arbitrário. Pelo que acabamos de mostrar, (5.2.2) contém \mathcal{R}; logo (5.2.2) também contém \mathcal{E}. Isso prova que ABA\cup B\in\mathcal{E}, para todos A,BA,B\in\mathcal{E}.

  • Passo 2.

    Se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em \mathcal{E} então k=1Ak\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k}\in\mathcal{E}.

    Para cada t1t\geq 1, seja Bt=k=1tAkB_{t}=\bigcup_{k=1}^{t}A_{k}; temos Btk=1AkB_{t}\nearrow\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k} e BtB_{t}\in\mathcal{E} para todo t1t\geq 1, pelo passo 1. Como \mathcal{E} é uma classe monotônica, segue que k=1Ak\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k}\in\mathcal{E}.

  • Passo 3.

    Se AA\in\mathcal{E} e BB\in\mathcal{R} então ABA\setminus B\in\mathcal{E}.

    Seja BB\in\mathcal{R} fixado e considere a classe de conjuntos:

    {A𝒜:AB}.\big{\{}A\in\mathcal{A}:A\setminus B\in\mathcal{E}\big{\}}. (5.2.3)

    Afirmamos que (5.2.3) é uma classe monotônica. De fato, o conjunto vazio está em (5.2.3), pois ∅︀\emptyset\in\mathcal{E}. Se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em (5.2.3) tal que AkAA_{k}\nearrow A (resp., tal que AkAA_{k}\searrow A) então A𝒜A\in\mathcal{A} e AkBA_{k}\setminus B\in\mathcal{E}, para todo k1k\geq 1; conclui-se então que AA está em (5.2.3) observando-se que (AkB)(AB)(A_{k}\setminus B)\nearrow(A\setminus B) (resp., que (AkB)(AB)(A_{k}\setminus B)\searrow(A\setminus B)). Isso prova que (5.2.3) é uma classe monotônica. Claramente, se AA\in\mathcal{R} então ABA\setminus B\in\mathcal{R}\subset\mathcal{E} e portanto (5.2.3) contém \mathcal{R}; concluímos então que (5.2.3) contém \mathcal{E}, o que prova que ABA\setminus B\in\mathcal{E}, para todo AA\in\mathcal{E} e todo BB\in\mathcal{R}.

  • Passo 4.

    Se A,BA,B\in\mathcal{E} então ABA\setminus B\in\mathcal{E}.

    Seja AA\in\mathcal{E} fixado e considere a classe de conjuntos:

    {B𝒜:AB}.\big{\{}B\in\mathcal{A}:A\setminus B\in\mathcal{E}\big{\}}. (5.2.4)

    De forma análoga ao que foi feito no passo 3, prova-se que (5.2.4) é uma classe monotônica usando o fato que BkBB_{k}\nearrow B (resp., BkBB_{k}\searrow B) implica em (ABk)(AB)(A\setminus B_{k})\searrow(A\setminus B) (resp., (ABk)(AB)(A\setminus B_{k})\nearrow(A\setminus B)). Finalmente, o que provamos no passo 3 implica que (5.2.4) contém \mathcal{R} e daí segue que (5.2.4) contém \mathcal{E}. Logo ABA\setminus B\in\mathcal{E}, para todos A,BA,B\in\mathcal{E}.∎

5.2.5 Lema (lema da classe σ\sigma-aditiva).

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos fechada por interseções finitas, i.e., AB𝒞A\cap B\in\mathcal{C}, para todos A,B𝒞A,B\in\mathcal{C}. Então a classe σ\sigma-aditiva gerada por 𝒞\mathcal{C} coincide com o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Em particular, toda classe σ\sigma-aditiva que contém uma classe fechada por interseções finitas 𝒞\mathcal{C} contém também o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}.

Demonstração.

Seja 𝒜\mathcal{A} o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C} e seja \mathcal{E} a classe σ\sigma-aditiva gerada por 𝒞\mathcal{C}. Evidentemente todo σ\sigma-anel é uma classe σ\sigma-aditiva e portanto 𝒜\mathcal{A} contém \mathcal{E}. Para mostrar que \mathcal{E} contém 𝒜\mathcal{A}, basta verificar que \mathcal{E} é um σ\sigma-anel. Assuma por um momento que já tenhamos mostrado que \mathcal{E} é fechado por interseções finitas. Segue então do Lema 5.1.20 que \mathcal{E} é um anel. Além do mais, se (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} é uma seqüência em \mathcal{E} então Bt=k=1tAkB_{t}=\bigcup_{k=1}^{t}A_{k}\in\mathcal{E} para todo t1t\geq 1 e Btk=1AkB_{t}\nearrow\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k}, donde k=1Ak\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k}\in\mathcal{E}. Concluímos então que \mathcal{E} é um σ\sigma-anel. Para completar a demonstração, verificaremos que ABA\cap B\in\mathcal{E}, para todos A,BA,B\in\mathcal{E}. Seja B𝒜B\in\mathcal{A} fixado e considere a classe de conjuntos:

{A𝒜:AB}.\big{\{}A\in\mathcal{A}:A\cap B\in\mathcal{E}\big{\}}. (5.2.5)

Afirmamos que (5.2.5) é uma classe σ\sigma-aditiva. Em primeiro lugar, o conjunto vazio está em (5.2.5), pois ∅︀B=∅︀\emptyset\cap B=\emptyset\in\mathcal{E}. Dados A1A_{1} e A2A_{2} em (5.2.5) com A1A2=∅︀A_{1}\cap A_{2}=\emptyset então A1B,A2BA_{1}\cap B,A_{2}\cap B\in\mathcal{E} e (A1B)(A2B)=∅︀(A_{1}\cap B)\cap(A_{2}\cap B)=\emptyset; como \mathcal{E} é uma classe σ\sigma-aditiva, segue que (A1B)(A2B)=(A1A2)B(A_{1}\cap B)\cup(A_{2}\cap B)=(A_{1}\cup A_{2})\cap B\in\mathcal{E} e portanto A1A2A_{1}\cup A_{2} está em (5.2.5). Suponha agora que A1A_{1} e A2A_{2} são elementos de (5.2.5) com A1A2A_{1}\subset A_{2}. Temos A1B,A2BA_{1}\cap B,A_{2}\cap B\in\mathcal{E} e A1BA2BA_{1}\cap B\subset A_{2}\cap B; segue então que (A2B)(A1B)(A_{2}\cap B)\setminus(A_{1}\cap B)\in\mathcal{E}. Como (A2B)(A1B)=(A2A1)B(A_{2}\cap B)\setminus(A_{1}\cap B)=(A_{2}\setminus A_{1})\cap B, concluímos que A2A1A_{2}\setminus A_{1} está em (5.2.5). Para concluir a demonstração de que (5.2.5) é uma classe σ\sigma-aditiva, seja (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} uma seqüência em (5.2.5) com AkAA_{k}\nearrow A. Daí AkBA_{k}\cap B\in\mathcal{E}, para todo k1k\geq 1 e (AkB)(AB)(A_{k}\cap B)\nearrow(A\cap B); segue então que ABA\cap B\in\mathcal{E} e portanto AA está em (5.2.5). Demonstramos então que (5.2.5) é uma classe σ\sigma-aditiva. Se o conjunto BB pertence a 𝒞\mathcal{C} então AB𝒞A\cap B\in\mathcal{C}\subset\mathcal{E}, para todo A𝒞A\in\mathcal{C} e portanto (5.2.5) contém 𝒞\mathcal{C}; concluímos então que (5.2.5) contém \mathcal{E}, isto é, ABA\cap B\in\mathcal{E}, para todo AA\in\mathcal{E} e todo B𝒞B\in\mathcal{C}. Seja agora BB\in\mathcal{E} arbitrário. Pelo que acabamos de mostrar, (5.2.5) contém 𝒞\mathcal{C} e portanto contém \mathcal{E}; concluímos então que ABA\cap B\in\mathcal{E}, para todos A,BA,B\in\mathcal{E}. ∎

Vejamos agora algumas aplicações interessantes dos Lemas 5.2.4 e 5.2.5.

5.2.6 Lema.

Sejam μ:𝒜[0,+[\mu:\mathcal{A}\to\left[0,+\infty\right[, ν:𝒜[0,+[\nu:\mathcal{A}\to\left[0,+\infty\right[ medidas finitas num σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A}. Seja 𝒞𝒜\mathcal{C}\subset\mathcal{A} uma classe fechada por interseções finitas tal que 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Se μ(A)=ν(A)\mu(A)=\nu(A) para todo A𝒞A\in\mathcal{C} então μ=ν\mu=\nu.

Demonstração.

Como vimos no Exemplo 5.2.2, a classe (5.2.1) formada pelos conjuntos onde μ\mu e ν\nu coincidem é uma classe σ\sigma-aditiva. Como (5.2.1) contém 𝒞\mathcal{C} e 𝒞\mathcal{C} é fechada por interseções finitas, segue do Lema 5.2.5 que (5.2.1) contém 𝒜\mathcal{A}. Logo μ=ν\mu=\nu. ∎

O Lema 5.2.6 pode ser pensado como um lema de unicidade de extensão de medidas; de fato, um enunciado alternativo para o Lema 5.2.6 é o seguinte: uma medida finita μ\mu numa classe de conjuntos 𝒞\mathcal{C} fechada por interseções finitas extende-se no máximo de uma maneira a uma medida finita no σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Logo adiante apresentaremos uma generalização desse resultado.

Outro resultado interessante é o seguinte lema de aproximação.

5.2.7 Lema.

Seja μ:𝒜[0,+[\mu:\mathcal{A}\to\left[0,+\infty\right[ uma medida finita num σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A} e seja 𝒜\mathcal{R}\subset\mathcal{A} um anel tal que 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}. Então para todo A𝒜A\in\mathcal{A} e todo ε>0\varepsilon>0 existe BB\in\mathcal{R} tal que μ(AB)<ε\mu(A\bigtriangleup B)<\varepsilon. Em particular, pelo resultado do Exercício 5.12, temos |μ(A)μ(B)|<ε\big{|}\mu(A)-\mu(B)\big{|}<\varepsilon.

Demonstração.

Considere a classe de conjuntos:

{A𝒜:para todo ε>0, existe B tal que μ(AB)<ε}.\big{\{}A\in\mathcal{A}:\text{para todo $\varepsilon>0$, existe $B\in\mathcal{% R}$ tal que $\mu(A\bigtriangleup B)<\varepsilon$}\big{\}}. (5.2.6)

Evidentemente (5.2.6) contém o anel \mathcal{R}. Se mostrarmos que (5.2.6) é uma classe monotônica, a tese seguirá do Lema 5.2.4. Seja (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} uma seqüência em (5.2.6) tal que AkAA_{k}\nearrow A (resp., tal que AkAA_{k}\searrow A) e seja dado ε>0\varepsilon>0. Temos que AkA=AAkA_{k}\bigtriangleup A=A\setminus A_{k} (resp., que AkA=AkAA_{k}\bigtriangleup A=A_{k}\setminus A) e portanto (AkA)∅︀(A_{k}\bigtriangleup A)\searrow\emptyset. Como a medida μ\mu é finita, obtemos limkμ(AkA)=0\lim_{k\to\infty}\mu(A_{k}\bigtriangleup A)=0 e portanto existe k1k\geq 1 tal que μ(AkA)<ε2\mu(A_{k}\bigtriangleup A)<\frac{\varepsilon}{2}. Como AkA_{k} está em (5.2.6), existe BB\in\mathcal{R} tal que μ(AkB)<ε2\mu(A_{k}\bigtriangleup B)<\frac{\varepsilon}{2}. Mas (veja Exercício 5.11):

AB(AAk)(AkB)A\bigtriangleup B\subset(A\bigtriangleup A_{k})\cup(A_{k}\bigtriangleup B)

e portanto, pelo item (e) do Lema 5.1.6:

μ(AB)μ(AAk)+μ(AkB)<ε2+ε2=ε.\mu(A\bigtriangleup B)\leq\mu(A\bigtriangleup A_{k})+\mu(A_{k}\bigtriangleup B% )<\frac{\varepsilon}{2}+\frac{\varepsilon}{2}=\varepsilon.

Isso prova que AA está em (5.2.6) e completa a demonstração. ∎

A hipótese de finitude das medidas nos Lemas 5.2.6 e 5.2.7 é muito restritiva. Vamos agora relaxar essa hipótese.

5.2.8 Definição.

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos com ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C} e seja μ:𝒞[0,+]\mu:\mathcal{C}\to[0,+\infty] uma medida em 𝒞\mathcal{C}. Dizemos que um conjunto AA (não necessariamente em 𝒞\mathcal{C}) é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu se existe uma seqüência (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} em 𝒞\mathcal{C} tal que Ak=1AkA\subset\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k} e μ(Ak)<+\mu(A_{k})<+\infty, para todo k1k\geq 1. Dizemos que a medida μ\mu é σ\sigma-finita se todo conjunto AA em 𝒞\mathcal{C} é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu.

Evidentemente, se A𝒞A\in\mathcal{C} e μ(A)<+\mu(A)<+\infty então AA é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu; em particular, toda medida finita é σ\sigma-finita. Note que se AA é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu e BAB\subset A então BB também é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu. Em particular, se XX é um conjunto tal que 𝒞(X)\mathcal{C}\subset\wp(X) e X𝒞X\in\mathcal{C} então μ\mu é σ\sigma-finita se e somente se XX é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu, isto é, se somente se existe uma seqüência (Ak)k1(A_{k})_{k\geq 1} em 𝒞\mathcal{C} tal que X=k=1AkX=\bigcup_{k=1}^{\infty}A_{k} e μ(Ak)<+\mu(A_{k})<+\infty, para todo k1k\geq 1.

5.2.9 Observação.

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos com ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C} e seja μ:𝒞[0,+]\mu:\mathcal{C}\to[0,+\infty] uma medida em 𝒞\mathcal{C}; denote por 𝒜\mathcal{A} o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Se a medida μ\mu é σ\sigma-finita então todo elemento AA de 𝒜\mathcal{A} é σ\sigma-finito com respeito a μ\mu. De fato, pelo resultado do Exercício 5.20, todo A𝒜A\in\mathcal{A} pode ser coberto por uma união enumerável de elementos de 𝒞\mathcal{C}; mas cada elemento de 𝒞\mathcal{C} pode ser coberto por uma união enumerável de elementos de 𝒞\mathcal{C} de medida finita. Logo AA pode ser coberto por uma união enumerável de elementos de 𝒞\mathcal{C} de medida finita. Vemos então que se μ¯:𝒜[0,+]\bar{\mu}:\mathcal{A}\to[0,+\infty] é uma medida em 𝒜\mathcal{A} que estende μ\mu então a σ\sigma-finitude de μ\mu implica na σ\sigma-finitude de μ¯\bar{\mu} (a recíproca não é verdadeira, como veremos no Exemplo 5.2.14).

5.2.10 Notação.

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos e XX um conjunto arbitrário. Denotamos por 𝒞|X\mathcal{C}|_{X} a classe de conjuntos:

𝒞|X={AX:A𝒞}.\mathcal{C}|_{X}=\big{\{}A\cap X:A\in\mathcal{C}\big{\}}.

Note que se a classe de conjuntos 𝒞\mathcal{C} é fechada por interseções finitas e se X𝒞X\in\mathcal{C} então:

𝒞|X={A𝒞:AX}=𝒞(X).\mathcal{C}|_{X}=\big{\{}A\in\mathcal{C}:A\subset X\big{\}}=\mathcal{C}\cap\wp% (X).

Em particular, nesse caso, se ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C} e μ:𝒞[0,+]\mu:\mathcal{C}\to[0,+\infty] é uma medida em 𝒞\mathcal{C} então a restrição de μ\mu a 𝒞|X\mathcal{C}|_{X} também é uma medida.

5.2.11 Lema.

Se 𝒜\mathcal{A} é um σ\sigma-anel e XX é um conjunto arbitrário então 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} é um σ\sigma-anel. Além do mais, se 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por uma classe de conjuntos 𝒞\mathcal{C} então 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} é o σ\sigma-anel gerado por 𝒞|X\mathcal{C}|_{X}.

Demonstração.

A prova de que 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} é um σ\sigma-anel é deixada a cargo do leitor (veja Exercício 5.18). Seja \mathcal{B} o σ\sigma-anel gerado por 𝒞|X\mathcal{C}|_{X}. Como 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} é um σ\sigma-anel que contém 𝒞|X\mathcal{C}|_{X}, temos que 𝒜|X\mathcal{B}\subset\mathcal{A}|_{X}. Para mostrar que 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} está contido em \mathcal{B}, considere a coleção de conjuntos:

{A𝒜:AX}.\big{\{}A\in\mathcal{A}:A\cap X\in\mathcal{B}\big{\}}. (5.2.7)

Verifica-se diretamente que (5.2.7) é um σ\sigma-anel. Como (5.2.7) contém 𝒞\mathcal{C} e 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}, concluímos que (5.2.7) contém 𝒜\mathcal{A}, ou seja, AXA\cap X\in\mathcal{B}, para todo A𝒜A\in\mathcal{A}. Isso mostra que 𝒜|X\mathcal{A}|_{X}\subset\mathcal{B} e completa a demonstração. ∎

Estamos agora em condições de generalizar os Lemas 5.2.6 e 5.2.7.

5.2.12 Lema.

Sejam μ:𝒜[0,+]\mu:\mathcal{A}\to[0,+\infty], ν:𝒜[0,+]\nu:\mathcal{A}\to[0,+\infty] medidas num σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A}. Seja 𝒞𝒜\mathcal{C}\subset\mathcal{A} uma classe fechada por interseções finitas tal que44 4 A hipótese ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C} só foi colocada para que possamos dizer que μ|𝒞\mu|_{\mathcal{C}} é uma medida (recorde Definição 5.1.1). Note, no entanto, que essa hipótese não é nada restritiva já que μ(∅︀)=ν(∅︀)=0\mu(\emptyset)=\nu(\emptyset)=0 e que a classe 𝒞\mathcal{C} é fechada por interseções finitas se e somente se 𝒞{∅︀}\mathcal{C}\cup\{\emptyset\} o é; podemos então sempre substituir 𝒞\mathcal{C} por 𝒞{∅︀}\mathcal{C}\cup\{\emptyset\} se necessário. ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C}; suponha que 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}. Se μ|𝒞=ν|𝒞\mu|_{\mathcal{C}}=\nu|_{\mathcal{C}} e A𝒜A\in\mathcal{A} é σ\sigma-finito com respeito a μ|𝒞\mu|_{\mathcal{C}} então μ(A)=ν(A)\mu(A)=\nu(A). Em particular, pela Observação 5.2.9, se a medida μ|𝒞\mu|_{\mathcal{C}} é σ\sigma-finita e se μ|𝒞=ν|𝒞\mu|_{\mathcal{C}}=\nu|_{\mathcal{C}} então μ=ν\mu=\nu.

Demonstração.

Seja X𝒞X\in\mathcal{C} com μ(X)<+\mu(X)<+\infty. Afirmamos que μ\mu e ν\nu coincidem em 𝒜|X\mathcal{A}|_{X}. De fato, 𝒞|X\mathcal{C}|_{X} é uma classe fechada por interseções finitas que gera o σ\sigma-anel 𝒜|X\mathcal{A}|_{X} (veja Lema 5.2.11); como μ\mu e ν\nu coincidem em 𝒞|X𝒞\mathcal{C}|_{X}\subset\mathcal{C}, segue do Lema 5.2.6 aplicado às medida finitas μ|𝒜|X\mu|_{\mathcal{A}|_{X}} e ν|𝒜|X\nu|_{\mathcal{A}|_{X}} que μ\mu e ν\nu coincidem em 𝒜|X\mathcal{A}|_{X}. Seja agora A𝒜A\in\mathcal{A} e suponha que AA é σ\sigma-finito com respeito a μ|𝒞\mu|_{\mathcal{C}}; mostremos que μ(A)=ν(A)\mu(A)=\nu(A). Seja (Xk)k1(X_{k})_{k\geq 1} uma seqüência em 𝒞\mathcal{C} com Ak=1XkA\subset\bigcup_{k=1}^{\infty}X_{k} e μ(Xk)<+\mu(X_{k})<+\infty, para todo k1k\geq 1. Para cada k1k\geq 1 seja Yk=Xki=0k1XiY_{k}=X_{k}\setminus\bigcup_{i=0}^{k-1}X_{i}, onde X0=∅︀X_{0}=\emptyset. Pelo resultado do Exercício 1.19, os conjuntos (Yk)k1(Y_{k})_{k\geq 1} são dois a dois disjuntos e k=1Xk=k=1Yk\bigcup_{k=1}^{\infty}X_{k}=\bigcup_{k=1}^{\infty}Y_{k}. Temos A=k=1(YkA)A=\bigcup_{k=1}^{\infty}(Y_{k}\cap A) e portanto:

μ(A)=k=1μ(YkA),ν(A)=k=1ν(YkA).\mu(A)=\sum_{k=1}^{\infty}\mu(Y_{k}\cap A),\quad\nu(A)=\sum_{k=1}^{\infty}\nu(% Y_{k}\cap A).

Mas para todo k1k\geq 1 temos YkA𝒜(Xk)=𝒜|XkY_{k}\cap A\in\mathcal{A}\cap\wp(X_{k})=\mathcal{A}|_{X_{k}} e segue da primeira parte da demonstração que μ(YkA)=ν(YkA)\mu(Y_{k}\cap A)=\nu(Y_{k}\cap A), para todo k1k\geq 1. Logo μ(A)=ν(A)\mu(A)=\nu(A). ∎

5.2.13 Corolário.

Seja 𝒞\mathcal{C} uma classe de conjuntos fechada por interseções finitas tal que ∅︀𝒞\emptyset\in\mathcal{C}. Se μ:𝒞[0,+]\mu:\mathcal{C}\to[0,+\infty] é uma medida σ\sigma-finita então μ\mu possui no máximo uma extensão a uma medida no σ\sigma-anel gerado por 𝒞\mathcal{C}; uma tal extensão (caso exista) é automaticamente σ\sigma-finita.

Demonstração.

Segue do Lema 5.2.12 e da Observação 5.2.9. ∎

Resultados sobre existência de extensões de medidas para σ\sigma-anéis serão estudados mais adiante na Seção 5.3.

5.2.14 Exemplo.

Nas hipóteses do Lema 5.2.12 é realmente necessário supor que AA seja σ\sigma-finito com respeito a μ|𝒞\mu|_{\mathcal{C}}; assumir apenas a σ\sigma-finitude com respeito a μ\mu e a ν\nu não é suficiente. De fato, considere as medidas μ:()[0,+]\mu:\wp(\mathds{R})\to[0,+\infty] e ν:()[0,+]\nu:\wp(\mathds{R})\to[0,+\infty] definidas por:

μ(A)=|A|,ν(A)=|A({0})|,\mu(A)=|A\cap\mathds{Q}|,\quad\nu(A)=\big{|}A\cap\big{(}\mathds{Q}\setminus\{0% \}\big{)}\big{|},

para todo AA\subset\mathds{R}, onde |E|{+}|E|\in\mathds{N}\cup\{+\infty\} denota o número de elementos de um conjunto EE. Seja 𝒮\mathcal{S} o semi-anel constituído pelos intervalos da forma ]a,b]\left]a,b\right], a,ba,b\in\mathds{R} (veja (5.1.5)). Temos μ(A)=ν(A)=+\mu(A)=\nu(A)=+\infty, para todo A𝒮A\in\mathcal{S}, A∅︀A\neq\emptyset. Se 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por 𝒮\mathcal{S} (pelo resultado do Exercício 5.9, 𝒜\mathcal{A} coincide com a σ\sigma-álgebra de Borel de \mathds{R}) então as medidas μ|𝒜\mu|_{\mathcal{A}} e ν|𝒜\nu|_{\mathcal{A}} são ambas σ\sigma-finitas. De fato, para todo xx\in\mathds{R}, o conjunto unitário {x}\{x\} está em 𝒜\mathcal{A} e:

=()x{x};\mathds{R}=(\mathds{R}\setminus\mathds{Q})\cup\bigcup_{x\in\mathds{Q}}\{x\};

além do mais, μ()=ν()=0\mu(\mathds{R}\setminus\mathds{Q})=\nu(\mathds{R}\setminus\mathds{Q})=0, μ({x})=1\mu\big{(}\{x\}\big{)}=1 e ν({x})1\nu\big{(}\{x\}\big{)}\leq 1, para todo xx\in\mathds{Q}. No entanto, temos μ|𝒜ν|𝒜\mu|_{\mathcal{A}}\neq\nu|_{\mathcal{A}}, já que μ({0})=1\mu\big{(}\{0\}\big{)}=1 e ν({0})=0\nu\big{(}\{0\}\big{)}=0.

Generalizamos agora o Lema 5.2.7.

5.2.15 Lema.

Seja μ:𝒜[0,+]\mu:\mathcal{A}\to[0,+\infty] uma medida num σ\sigma-anel 𝒜\mathcal{A} e seja 𝒜\mathcal{R}\subset\mathcal{A} um anel tal que 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}. Suponha que A𝒜A\in\mathcal{A} é σ\sigma-finito com respeito a μ|\mu|_{\mathcal{R}} (pela Observação 5.2.9, esse é o caso, por exemplo, se a medida μ|\mu|_{\mathcal{R}} é σ\sigma-finita). Se μ(A)<+\mu(A)<+\infty então para todo ε>0\varepsilon>0 existe BB\in\mathcal{R} tal que μ(AB)<ε\mu(A\bigtriangleup B)<\varepsilon. Em particular, pelo resultado do Exercício 5.12, temos |μ(A)μ(B)|<ε\big{|}\mu(A)-\mu(B)\big{|}<\varepsilon.

Demonstração.

Seja A𝒜A\in\mathcal{A} um conjunto σ\sigma-finito com respeito a μ|\mu|_{\mathcal{R}} tal que μ(A)<+\mu(A)<+\infty; seja dado ε>0\varepsilon>0. Seja (Xk)k1(X_{k})_{k\geq 1} uma seqüência em \mathcal{R} com Ak=1XkA\subset\bigcup_{k=1}^{\infty}X_{k} e μ(Xk)<+\mu(X_{k})<+\infty, para todo k1k\geq 1. Para cada k1k\geq 1 seja Yk=i=1kXiY_{k}=\bigcup_{i=1}^{k}X_{i}, de modo que YkY_{k}\in\mathcal{R}, μ(Yk)<+\mu(Y_{k})<+\infty e (AYk)∅︀(A\setminus Y_{k})\searrow\emptyset. Como μ(A)<+\mu(A)<+\infty, temos limkμ(AYk)=0\lim_{k\to\infty}\mu(A\setminus Y_{k})=0 e portanto existe k1k\geq 1 tal que μ(AYk)<ε2\mu(A\setminus Y_{k})<\frac{\varepsilon}{2}. Seja A=AYkA^{\prime}=A\cap Y_{k}; daí AA=AYkA\bigtriangleup A^{\prime}=A\setminus Y_{k} e portanto:

μ(AA)<ε2,\mu(A\bigtriangleup A^{\prime})<\frac{\varepsilon}{2},

e A𝒜(Yk)=𝒜|YkA^{\prime}\in\mathcal{A}\cap\wp(Y_{k})=\mathcal{A}|_{Y_{k}}. Vamos agora aplicar o Lema 5.2.7 à medida finita μ|𝒜|Yk\mu|_{\mathcal{A}|_{Y_{k}}}; para isso, note que, pelo Exercício 5.18, |Yk\mathcal{R}|_{Y_{k}} é um anel e, pelo Lema 5.2.11, 𝒜|Yk\mathcal{A}|_{Y_{k}} é o σ\sigma-anel gerado por |Yk\mathcal{R}|_{Y_{k}}. Vemos então que existe B|YkB\in\mathcal{R}|_{Y_{k}}\subset\mathcal{R} tal que μ(AB)<ε2\mu(A^{\prime}\bigtriangleup B)<\frac{\varepsilon}{2}. Daí (veja Exercício 5.11):

AB(AA)(AB)A\bigtriangleup B\subset(A\bigtriangleup A^{\prime})\cup(A^{\prime}% \bigtriangleup B)

e portanto:

μ(AB)μ(AA)+μ(AB)<ε2+ε2=ε,\mu(A\bigtriangleup B)\leq\mu(A\bigtriangleup A^{\prime})+\mu(A^{\prime}% \bigtriangleup B)<\frac{\varepsilon}{2}+\frac{\varepsilon}{2}=\varepsilon,

o que completa a demonstração. ∎

5.2.16 Exemplo.

Sejam μ\mu, 𝒮\mathcal{S} e 𝒜\mathcal{A} definidos como no Exemplo 5.2.14; seja \mathcal{R} o anel gerado por 𝒮\mathcal{S}, de modo que 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}. Pelo Lema 5.1.21, todo elemento de \mathcal{R} é uma união finita disjunta de elementos de 𝒮\mathcal{S} e portanto μ(A)=+\mu(A)=+\infty, para todo AA\in\mathcal{R} com A∅︀A\neq\emptyset. Temos que a medida μ|𝒜\mu|_{\mathcal{A}} é σ\sigma-finita (mas μ|\mu|_{\mathcal{R}} não é). Dado A𝒜A\in\mathcal{A} com μ(A)<+\mu(A)<+\infty (por exemplo, se AA é um subconjunto finito de \mathds{Q}) então μ(AB)=+\mu(A\bigtriangleup B)=+\infty, para todo BB\in\mathcal{R} com B∅︀B\neq\emptyset (veja Exercício 5.12). Logo a tese do Lema 5.2.15 não é verdadeira para a medida μ|𝒜\mu|_{\mathcal{A}} e para o anel \mathcal{R}, embora μ|𝒜\mu|_{\mathcal{A}} seja σ\sigma-finita.

5.2.17 Exemplo.

Seja 𝒜=()\mathcal{A}=\wp(\mathds{N}) e \mathcal{R} o conjunto das partes finitas de \mathds{N}; daí \mathcal{R} é um anel e 𝒜\mathcal{A} é o σ\sigma-anel gerado por \mathcal{R}. Seja μ:𝒜[0,+]\mu:\mathcal{A}\to[0,+\infty] a medida de contagem (veja a Definição 2.2). Note que μ|\mu|_{\mathcal{R}} é uma medida finita (e portanto σ\sigma-finita). Dado A𝒜A\in\mathcal{A} com μ(A)=+\mu(A)=+\infty então para todo BB\in\mathcal{R} temos μ(AB)=+\mu(A\bigtriangleup B)=+\infty. Vemos que a hipótese μ(A)<+\mu(A)<+\infty é essencial no Lema 5.2.15.